segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

CECÍLIA MEIRELES – UMA INTELECTUAL “SUI GENERIS”

A poetisa Cecília Meireles foi lembrada por muitos como uma mulher distante e reservada. Dona de uma composição poética altamente feminina, chegou a transformar a vida em canto.
Segundo a escritora Lygia Fagundes Telles “ela era muito elegante , olhos verdes e um sorriso aberto, mas ao mesmo tempo, parecia inatingível e sempre olhava as pessoas como se estivesse se despedindo”. (Veja, 1998, p.144).
Nasceu no Rio em 07 de novembro de 1901 e aos 3 anos de idade conheceu a orfandade, vindo a morar com a avó materna.
Foi poetisa, professora (primária e universitária–Literatura Brasileira e Teoria), pedagoga e jornalista, passando horas e horas, em sua biblioteca, escrevendo, e só recentemente é que descobrimos a dimensão total do seu trabalho literário – textos em prosa, crônicas, reflexões sobre educação e ensaios sobre literatura.
Sua poesia lírica é altamente personalista, simples na forma, mas contendo imagens e simbolismos complexos, o que lhe rendeu importante posição na Literatura Brasileira do século XX.
A organização da prosa ceciliana foi entregue ao professor da Universidade Federal do Rio, Leodegário de Azevedo Filho que dividiu a obra em núcleos temáticos. Em suas crônicas, Cecília se mostrou capaz de falar de inúmeros assuntos e com muita desenvoltura, tornando-se reconhecida como uma intelectual “sui generis”.
A escritora confidenciou que “os livros eram um burburinho, um conjunto de vozes, que sempre lhe diziam coisas encantadoras, maravilhosas”. (Programa minas um livro aberto, 1999).
Para Letícia Mallard, escritora e professora da UFMG “ o binômio solidão e silêncio marcam a obra ceciliana, bem como, a transitoriedade da vida, do tempo, devido a sua sensibilidade causada pela orfandade”. (Programa Minas um livro aberto, 1999).
Em 1919 Cecília estréia na poesia com “Espectros” – conjunto de sonetos simbolistas, decadentistas, baseado numa composição poética nada modernista. Seus temas giravam em torno do sofrimento, da dor, da natureza que está agindo intaticamente com a alma, o sentimento, misticismo, a religiosidade, etc. Outra linha da sua poesia foi intitulada “poesia enquanto música” pois explorou a sonoridade das palavras e dos versos; foi também musicista, chegando a compor música para crianças e adultos.
Nessa primeira fase (Espectros), Cecília está bem próxima do grupo da revista FESTA que tinha o propósito de renovar a poesia, sem romper com a tradição, sendo considerados pelo grupo de Oswald de Andrade como passadistas. Ela acreditava que era marginalizada por ser mulher e ainda recorda, que Oswald “tinha uma ponta de preconceito com relação às escritoras”. (Veja, 1998, p.145).

Silviano Santiago (crítico literário) comentou que:
“há um time de mulheres notáveis
esperando lembrança, como Hen-
riqueta Lisboa, Adalgisa Neri ou
a escritora comunista Eneida, e que
a literatura feminina só estourou na
década de 70 e 80, colocando auto-
ras como Clarice Lispector, Rachel
de Queiroz e Lígia Fagundes Telles
na linha de frente.” (Veja, 1998, p.145).

“A passagem de Cecília pela revista Festa foi um meio legítimo para que ela chegasse ao pleno domínio da linguagem e fizesse uma poesia desvinculada de qualquer tradição”, comenta Azevedo Filho. (Veja, 1998, p. 145).
Com o livro “Viagem” de 1939, a escritora recebeu o prêmio de poesia pela Academia Brasileira de Letras. Nesse livro, a poetisa cristaliza seu estilo contido, sugestivo, rico de musicalidade, oscilando entre a melancolia e a ironia.
Quando um personagem chamava sua atenção, Cecília dizia ter “o vício de gostar de gente”, então, passava a trabalhar como ficcionista para descrevê-lo. Também percorreu inúmeros países, dizia não ser turista e sim viajante pelo desejo de “morar em cada coisa e descrever à origem de tudo”. (Veja, 1998, p.145).
Foi considerada por muitos escritores e críticos como fazedora do primeiro time de cronistas brasileiros, ao lado de Rubem Braga ou Paulo Mendes Campos.
Leu, traduziu e apresentou ao país vários poetas orientais como o indiano Tagore, o chinês Li Po e o japonês Bashô, e introduziu no Brasil poetas portugueses, dentre eles, Fernando Pessoa.
Escreveu textos folclóricos e de crítica de arte, como ensaios sobre inúmeros pintores – Portinari, Rembrandt, Van Gogh e Torres-Garcia.
No texto “Despedida de Portinari”, ela retrata de modo pouco lisonjeiro personalidades importantes, como José Lins do Rego e Marques Rebelo, chamados por ela de “HIPÓCRITAS” porque a cumprimentavam em festas e falavam mal dela pelas costas.
Como educadora escreveu inúmeros textos opinativos sobre o seu tempo, chegando a comprar brigas, pois assinava diariamente para os jornais Diário de Notícias e A Manhã.
Em 1932, Cecília assinou o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que promulgava a ideia de que a educação deveria deixar de ser religiosa, com isso irritou a Igreja e intelectuais católicos.
Com o “Romanceiro da Inconfidência” de 1953, a poetisa retoma uma forma poética de tradição ibérica dos romances populares, para constituir o episódio da Inconfidência Mineira. Encontra-se em suas páginas a mineração, as rivalidades e contendas, os impostos cobrados pela Coroa, a conscientização de alguns intelectuais e os ideais de liberdade. Ela afirmou tratar-se de “uma história feita de coisas eternas: ouro, amor, liberdade e traição”. ( Programa minas um livro aberto, 1999).
Para Ivete Walty, também da UFMG, “as poesias para crianças escritas por Cecília, não eram poesias para educar, mas sim, para sensibilizar”. (Programa minas um livro aberto, 1999).
Os aspectos mais importantes dos poemas cecilianos, segundo Sérgio Peixoto da UFMG consiste “na extrema musicalidade do verso. A sua poesia é metafórica tendendo para o símbolo. O símbolo como aquela coisa capaz de traduzir o mistério que há no mundo, uma visão esotérica quase que do mundo numa linguagem simbólica, melodiosa, tentando atingir o inefável. Sua poesia é atemporal por falar de modo bastante pessoal das principais coisas em relação ao homem e ao ser deste homem no mundo. A morte de que Cecília fala em seus poemas é a consciência clara da transitoriedade da vida”. [ grifos meus]. (Programa minas um livro aberto, 1999).
A grande poetisa viveu sobre a influência do modernismo, mas não se filiou a nenhum estilo de época; partiu em 1964, deixando-nos um grande legado:
“Aprendi com a primavera a me deixar cortar. E a
voltar sempre inteira

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